‘Só depois que atingir toda a massa’

Onde o músico quer chegar? Talvez, a resposta mais sensata seria: na trilha da novela das oito. E assim vivo na contradição: como eu, que não vejo novela nem acompanho BBB torço para que meus artistas toquem no horário nobre? Qual o limite para se chegar à ascensão sem perder a alma? Quanto e como pagar para tocar na rádio? Como fazer a música chegar à massa sem que vire mais um rótulo da cultura de massa? Ou, simplesmente, como ser respeitado pelo trabalho independente?

São perguntas que me encasquetam o juízo. Mais ainda depois desta semana em que, pela segunda vez, a Orquestra Contemporânea de Olinda tocou antes de Pitty num festival. No intervalo das músicas da Orquestra, fãs frenéticos da baiana gritavam: ‘Pitty! Pitty! Pitty!’.
A resposta foi música: ‘Toda Massa’, letra de Tiné que fala exatamente dos fenômenos musicais que entram em nossas casas pela TV e pelas rádios.
Creio que poucos daqueles jovens entenderam o recado.

O importante é que foi dado. Mesmo que o som do nosso show tenha sido 8 vezes inferior ao de Pitty; que em nosso camarim tivesse faltado o suco de frutas e a cerveja gelada; ou que nossa câmera tivesse sido tirada do melhor local porque o técnico de Pitty queria afinar os instrumentos bem ali. Chegou na TV Globo, tapete vermelho. Cabe ao artista e equipe enrolar o tapete e pisar firme e descalço.
“Eu não vim de terra alheia. Trago uma estrela no peito. Como o sol ela alumeia” (Bongar)

VOO 6133 RECIFE – SALVADOR

Estou Indo passar mais uns dias fora de casa.

A parada será em Salvador para a primeira reunião de coordenação da Feira Música Brasil 2010. A FMB teve sua primeira edição em 2007, juntamente com o Porto Musical. Em 2006 havia acontecido a segunda edição do Porto. Naquela época, o Ministério da Cultura, liderado por Gilberto Gil esteve pela primeira vez no Porto Musical para anunciar o projeto da Copa das Culturas. Era ano de Copa do Mundo e o Brasil pretendia fazer uma grande copa e uma grande ação cultural levando diversos artistas para a Alemanha, juntariam um grande futebol com grandes shows musicais. No fim, o Brasil não mostrou um futebol tão bom e o projeto da música…bem, essa é outra história.

Nesta ida do MINC ao Porto Musical eles puderam conhecer a idéia do Porto, a estrutura da cidade, a sacada de fazer o evento pouco antes do carnaval, quando Recife já respira a época mais interessante do ano.  Profissionais brasileiros e estrangeiros encontrando-se nas ruas, vendo conferências, trocando discos, idéias e possibilidades.

Pouco depois, o MINC resolvia realizar a sua primeira grande feira nacional de música. Depois de alguns contatos, soubemos que esta feira se realizaria em Recife, na mesma época do Porto no ano seguinte. Deveríamos fazer juntos? Separados? Não havia alternativa, ela iria acontecer e nós ou estaríamos dentro ou estaríamos dentro. Como fazer a terceira edição do Porto na mesma época, fora disso tudo?

Participamos do projeto executivo, acrescentamos expertise, idéias, mas, a relação foi complexa. Quem veio não entendeu muito bem, achou a coisa meio esquizofrênica. Era um evento? Dois em um? Ninguém entendeu bem e nós menos ainda, saímos dessa experiência enfraquecidos, cansados, chateados. A primeira FMB poderia ter acabado com o Porto Musical. Mas, conseguimos aos poucos nos refazer, apesar de não ter conseguido realizar a edição seguinte em 2008, voltando apenas em 2009.

Foi de 2008 pra 2009 que o MINC sofreu mudanças internas interessantes. Pessoas ligadas ao mercado e com um olhar mais atento ao mundo independente brasileiro assumiram cargos de destaque, autonomia e decisão.  Fizeram um grande balanço da primeira FMB, perceberam os tropeços e erros, entre eles, um crucial – o Governo não deve enfraquecer as iniciativas da sociedade civil, deve sim, percebê-las, fomentá-las, acrescentar-lhes notoriedade, respeito e investimento. O MINC realizou a segunda FMB em dezembro de 2009 também em Recife, ainda tentando superar as heranças da primeira.

Mais organizada, interagindo mais com o mercado e mais próxima das demandas desse mercado, a segunda FMB foi importante para a consolidação da Rede Música Brasil, uma rede formada hoje por 13 entidades organizadas da música no Brasil, mas, ainda enfrentou críticas, sofreu com questões internas e ações com resultados fracos, apesar de ter tido sucesso na convocatória nacional com uma presença simbólica do mercado musical do Pais.

A terceira FMB acontecerá de 8 a 12 de dezembro em Belo Horizonte e desta vez já conectada com a Rede Música Brasil, parece estar encontrando seu caminho e sua vocação. Nesta terceira edição da FMB, o MINC/Funarte percebeu a importância e a contribuição preciosa que os outros eventos de negócios da música que já existem no Brasil podem dar para a realização da FMB.

Por fim, esses 5 eventos se reuniram: Feira da Música do Ceará, Mercado Cultural da Bahia, Brazil Central Music, Feira da Música do Sul e o Porto Musical. Animados com esse grupo, estamos contribuindo para que a FMB  encontre o sentido de sua existência, como ela pode complementar as iniciativas que já existem, vindo não para dividir e enfraquecer, mas, para somar, acrescentar, estimular e se divertir com a gente.

Tanta produção, pouca difusão…

Pernambuco é bastante reconhecido por sua cultura tão diversificada. E, mais ainda no que diz respeito a música, temos uma diversidade incrível de ritmos! Grupos ou artistas como Dj Dolores, Siba, Nação Zumbi, Spok Frevo Orquestra, Orquestra Contemporânea de Olinda, Eddie, Otto, Mundo livre S/A, Renata Rosa, Silvério Pessoa já são reconhecidos em todo Brasil e no exterior. No entanto, a grande maioria do público aqui no estado continua ignorando a existência dessa produção. Por que isso acontece? As bandas deixaram de circular ou de fazer seu trabalho? A resposta a estas perguntas é não! A grande questão é que o público não pode consumir aquilo que não conhece. E, eles não conhecem estas bandas porque elas não tocam nas rádios e nem estão nas TVs.

A difusão é, sem dúvida, o maior imbróglio da nossa produção musical. As rádios pernambucanas ou tocam todos os enlatados estrangeiros ou aqueles que podem pagar para tocar- e que, é claro, tem grandes chances de virar um sucesso de público!

Uma vez, uma pessoa da Fundarpe (Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco) comentou comigo que os técnicos do Tribunal de Contas de Pernambuco sempre questionavam os cachês de artistas como os que foram citados acima.  Ele explicou que eram, quase sempre,  questionadas as planilhas de pagamentos de cachês nas somas de 10, 15, 20 mil para “aqueles nomes que nunca tinham ouvido falar”! Porém, não havia nenhum tipo de comentário com as planilhas de 150, 200 mil de cachês para os famosos ou, pelo menos, já conhecidos por tocar nas rádios e em novelas.  Os técnicos do Tribunal de Contas, assim como o grande público,  não conhecem essa “fina produção”, porque é uma música pouco ou quase nada tocada pelas rádios e TV´s abertas.  Então, como uma boa parte das pessoas não têm muito interesse em conhecer o novo e/ou “desbravar” a diversidade cultural daqui do estado, elas também não vão poder, nem ao menos, saber quem são esses grupos.

A chamada consagração para uma boa parte do grande público, acaba não acontecendo para alguns grupos e artistas talentosíssimos- que, em sua maioria, já possuem mais de 5, 10 anos de carreira,  outros com mais de 6 turnês internacionais, alguns já tocaram para presidentes de repúblicas, uma boa parte já ganhou os maiores prêmios de música do Brasil, outros já foram indicados para o maiores prêmios mundiais, como o Grammy. Enfim, todos são respeitadíssimos pela crítica especializada do Brasil e de fora, mas o grande  público não conhece e nem tem acesso por pura falta de difusão ou por uma, não tão pura assim, ausência absoluta de interesse por cultura.

E não me venha dizer que esses grupos ou artistas fazem uma música pouco acessível, pois existe música para todos os gostos, faixas etárias… para os sentimentais e intelectuais! De Brigitti, música da Orquestra Contemporânea de Olinda; a Canoa Furada, de Siba; Crua, de Otto; os frevos da Spok Frevo; os sambinhas do Mundo Livre…  Numa boa, pra todos os gostos tem uma música pronta pra ser descoberta, apreciada, cantada, dançada e, por fim,  reconhecida!

Epílogo:

A esperança fica nas mãos de iniciativas de valor e importância ímpar como:

Roger de Renor e toda sua trajetória, muitas vezes, como uma voz solitária, divulgando essas bandas e artistas em seus programas,  como a Sopa,  na Rádio Oi ou o programa Na Rural. Agora, ocupando uma pasta importante, trabalha árduamente para colocar a TV Pernambuco funcionando, entre outros meios de comunicação ligados ao Governo de Pernambuco.

A ARPUB -Associação das Rádios Públicas – vem fazendo um trabalho muito bacana de conscientização das rádios públicas na valorização de todo tipo de música produzida no Brasil.