Um pequeno artigo sobre o Vale Cultura, publicado na edição 105 da Revista Continente

Numa proposta como a do Vale-Cultura há muito que se comemorar, e também muito o que se refletir sobre o tema e seus resultados.

É gratificante ver a cultura ser colocada num patamar maior, num nível antes só debatido em torno do essencial para o trabalhador: alimentação e transporte. Vê-la compor a tríade dos “Vales”  e ser  percebida com um olhar mais amplo, saindo da visão do puro entretenimento, do descartável, do desnecessário. Finalmente, a cultura é entendida como um componente forte na formação do pensamento, de novas formas de ver o mundo e, consequentemente, de estímulo e complemento à educação básica do cidadão.

A grande sacada da proposta é voltar os olhos e o fomento para o consumo dos produtos culturais. A produção já vem sendo incentivada e fomentada pelas inúmeras leis e fundos de incentivo à cultura, apesar dos limites e distorções dos mesmos. O Vale-Cultura pensa exatamente no consumo desta produção, no escoamento e no acesso maior da população a todos os níveis dessa gigantesca produção cultural brasileira, que em determinadas áreas e segmentos não chega a alcançar um público expressivo e  sequer notoriedade. É a partir daí que começamos a refletir sobre  alguns pontos.

A intenção ao se criar o Vale-Cultura é aumentar consideravelmente o consumo de alguns segmentos como cinema, dança, museus e artes-cênicas. Mas, como numa proposta destas não é possível delimitar campos ou pré determinar caminhos, naturalmente, num primeiro momento o trabalhador empregará seu Vale-Cultura no produto que ele já conhece ou já ouviu falar, ou seja, aquele que ele viu na televisão ou ouviu no rádio.

No segmento da música, iria esse cidadão empregar seu Vale num concerto ou show de um artista que ele nunca viu ou ouviu ? Como ele pode empregar seu Vale numa coisa que ele não conhece? É fato: uma boa parte da música contemporânea brasileira de alta qualidade não toca nas rádios, não está na TV. Assim, podemos imaginar que também num primeiro momento, o Vale-Cultura poderá ir para os mesmos lugares, onde já ia o pouco dinheiro que o trabalhador tinha para o lazer. Mas, desta vez, com uma diferença: ele não paga sozinho, pagam também o empregador, o Governo, os contribuintes.

Do ponto de vista do produtor cultural, alguns poderão sentir imediatamente um impacto do Vale-Cultura no seu público, mas, outros, demorarão para perceber qualquer impacto em suas produções. Assim, os resultados esperados, bastante nobres e positivos, só virão se pensarmos num conjunto de ações complementares. Dessa forma, o Vale-Cultura traz também a oportunidade de pensar, por exemplo, em como melhorar a difusão no país, como democratiza-la e ampliá-la.

Ir além do que conhecemos por “produto comercial”, colocando os meios de comunicação para divulgar e promover a gigante e diversa produção cultural brasileira. Esta é uma excelente ação para fazer o objetivo do Vale-Cultura ser alcançado: dar oportunidade ao cidadão de conhecer coisas novas e investir também em produtos que tragam outro conteúdo, outra visão de mundo, outro pensamento ou, pelo menos, um pensamento novo e aditivo.

3 comentários sobre “Um pequeno artigo sobre o Vale Cultura, publicado na edição 105 da Revista Continente”

  1. Quando vc diz ‘só virão num conjunto de ações complementares.” quer dizer que antes de disponibilizar o dinheiro do vale cultura é preciso ensinar o trabalhador do significado de cultura. Somente assim o dinheiro disponibilizado terá o alcance desejado. Não concorda?! Do que adianta dar dinheiro se a grande maioria não sabe onde e nem como gastá-lo?! Esperemos que após a concretização desse projeto surjam outras iniciativas voltadas a educação do trabalhador. Isso aumentaria em muito os objetivos do Vale-Cultura.
    Muito bom seu texto… parabéns!!!!

    1. Olá Fernando,

      É isso mesmo. Não adianta dar este incentivo a este cidadão, sem dar a ele a oportunidade de conhecer coisas novas e ampliar seu conhecimento sobre a cultura tão diversa de nosso País. Se isso não for feito, no fim o incentivo vai acabar indo pro mais do mesmo. Vamos torcer para que o Vale Cultura seja colocado em prática acompanhado de ações complementares básicas, educação é cidadania, cidadania é cultura.

  2. Nesse ponto os produtores terão um papel fundamental também de, através da estratégia traçada para seus eventos, saber se utilizar do trunfo do vale cultura e atrair o público. Fica pesado colocar a responsabilidade da mudança de hábito cultural apenas no governo. Foi um grande passo o Vale Cultura, agora é toda a cadeia se articular e extrair os benefícios.
    Parabéns pelo texto!

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